segunda-feira, 27 de fevereiro de 2012

As greves dos trabalhadores da segurança pública coloca em xeque a Ordem Republicana

Iniciarei esta reflexão com a seguinte provocação: O Brasil é uma República, o povo
brasileiro ainda não é republicano. O Estado Brasileiro, constituído pelos seus diversos
Aparelhos, instituições e poderes, também não se republicanizaram completamente, ainda
há bolsões que preservam os resquícios das ditaduras Militar e Civil, se caracterizado pela
presença de oligarquia histórica que gerencia interesses próprios em detrimento dos da
Nação; pela prevalência da política do pão e circo; pela presença marcante da burocratização
excessiva que dificulta o acesso aos serviços e o exercício e gozo de direitos e da cidadania;
pelo autoritarismo operante; pela falta de transparência e de prestação de contas e pela falta
de controle do próprio Estado e da sociedade civil sobre as atividades executadas por essas
instituições.

Essa prévia análise estrutural e conjuntural nos permite entender o processo
de democratização do Estado e as resistências internas que colocam obstáculos ao avanço e
desafios a consolidação da democracia e efetivação do Estado Republicano. Dentro desse
contexto não precisamos de um esforço sobrenatural para identificar o setor da segurança
pública como o mais estratégico para levar avante o processo iniciado com o fim do regime
Militar. A segurança pública é mais que um direito fundamental, é o direito que possibilita o
exercício dos outros direitos. O cenário atual da segurança pública e principalmente dos
trabalhadores e trabalhadoras do setor é consequência natural da omissão consciente e
covarde daqueles que participaram da formulação da constituição de 1988. A segurança
pública militarizada com a finalidade de fazer a manutenção da ordem republicana já é uma
contradição insustentável, porque a ordem republicana pressupõe instituições democráticas e
relações democratizadas, ou seja, instituições cidadãs. A tentativa de manter instituições
humanas fixas, rígidas e alicerçadas em princípios e valores desumanos, portanto inaceitáveis,
num cenário dinâmico e em construção, com foco em valores e direitos que preservam e
priorizam a pessoa humana e seus direitos, que busca a construção das condições objetivas e
subjetivas para o exercício pleno da cidadania, é anacronismo. A tensão que aumenta a
pressão levará inevitavelmente ao desgaste humano e da própria instituição, que decorrerá
manifestações, protestos, levantes, greves e rupturas. O desgaste é mais humano que
institucional. O trabalhador e trabalhadora desenvolvem a consciência que também são
pessoas detentoras de direitos e de necessidades; são cidadãos e cidadãs que tem seus
direitos violados pelo Estado a quem juraram obediência cega a todo custo; descobrem que
esse Estado é palco de interesses de classes e é majoritariamente controlado pelos donos de
propriedade e do capital, e que sua existência é para manter essa ordem. Os agentes das
diversas agências de segurança pública se constituem em empregados privados “desses donos
do Brasil”, e que agirá sempre para defender seus interesses, e quando esses agentes públicos
tem seus interesses de classe violados e decidem reivindicá-los e defendê-los, o Estado mostra
sua verdadeira face e com mão de ferro lhes impõe sem misericórdia o sofrimento e a punição
exemplar, que outrora foram impostos sobre a população indefesa, a fim de manter seus
interesses, quando esta reivindicava direitos.

Essas ações tem se intensificado e consequentemente provocado à criação de novas
agendas públicas tanto para a população quanto para os poderes, executivos, legislativo,
judiciário e midiático, a fim de priorizarem e discutirem os velhos temas da pauta que todos
conhecemos. A nova república exige uma polícia republicana atualizada com o conhecimento
científico e com os avanços históricos das lutas pelos direitos humanos. A nova república
cometeu seu erro mais grave: manter a velha polícia e política de segurança. O novo surgiu
com remendos velhos. A polícia republicana que é cidadã tem como missão precípua garantir
que o cidadão exercite e goze dos seus direitos e para tal fim atuará preventivamente e
quando necessário repressivamente.

Não é forçoso concluir que as manifestações dos profissionais da segurança pública
no Brasil é consequência dos problemas estruturais da Republica de papel, e que denuncia a
imperiosa necessidade de mudança no sistema, caso contrário, teremos a expressão máxima
da contradição histórica: a ordem republicana está ameaçada pelos responsáveis por manter a
ordem.

Oséias Francisco da Silva
Especialista e Consultor em Segurança Pública, filósofo, psicanalista e guarda civil de São
Bernardo do Campo.


Oséias Francisco da Silva
Especialista e Consultor em Segurança Pública
Filósofo
Psicanalista
Escritor
Twitter: @oseiasfilosofo

"A segurança é indivisível. Ou existe igual segurança para todos ou não há segurança para ninguém. ( ... ) A segurança de cada nação depende da segurança de todos os membros da comunidade humana."
(Mikhail Gorbachev)

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